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Carolina Ribeiro Socióloga

Socióloga e Membro da Assembleia Municipal de Oliveira do Bairro (PS)

Da multiplicidade que ainda lembramos: falta futuro para a nossa história?

No dia 29 de novembro, a Assembleia Municipal de Oliveira do Bairro realizou uma segunda edição da iniciativa “25 de Novembro – Um Olhar Histórico”, que, este ano, contou com a presença de João Barroso Soares – figura histórica do Partido Socialista. À medida que fui pensando nas questões que lhe poderia colocar, até durante a sua lúcida exposição dos acontecimentos e da sua vivência, entre abril de 1974 e novembro de 1975, existiam duas perguntas que não queriam calar: Como podemos lembrar uma data que o povo desconhece? Celebrar uma data que a maioria da população que viveu nessa época estranha?

A lucidez de João Soares foi, sem dúvida, o ponto alto da sessão – julgo que, independentemente das ideologias subjacentes, todos os presentes concordarão. Descrever, aos 76 anos, em jeito de diário de memórias, os eventos vividos há 50 anos não é para todos. Aliás, a memória não é, de todo, para todos. João Soares referiu-o também, ao evocar a quem defenda os “três Salazares” – a mesma pessoa que se esconde atrás de um 25 de Novembro que não é dele, que não foi feito por pessoas como ele e que, certamente, quem o fez, em nada concordaria com ele.

Vivemos a época da farsa política, e onde ter memória pouco parece preocupar. Por isso, importa, mais do que nunca, devolver a verdade à população. Já o disse várias vezes, em contexto do 25 de Abril e Assembleia Municipal: nenhum evento histórico, mais ou menos marcante, é uma experiência implícita ou vivida da mesma forma por todos; por isso, não podemos exigir igual participação e perceção. Podemos, isso sim, apostar no conhecimento factual, científico, histórico. Imparcial, sempre que possível. Abrir portas e caminhos para que o desconhecimento e o “repetir muitas vezes até que se torne verdade” fiquem do lado de fora.

As questões que introduzi inicialmente não foram um acaso. Em doze anos de escolaridade obrigatória, muito pouco (ou nada) se fala do 16 de Março de 1974, do 11 de Março de 1975, do 25 de Novembro de 1975, do 2 de Abril de 1976 ou do 12 de Dezembro de 1976. Pouco se explora, também, a Guerra Colonial, quem deu o corpo à guerra e o cenário de consequências sombrias. No fundo, vivemos e ensinamos o passado a correr.

Não considero que tenhamos de celebrar todas essas datas. Aliás, para mim, um ponto é, tal como para muitos que já o referiram antes, claro: todas estas datas devem estar devidamente enquadradas nas celebrações do 25 de Abril – tal como se poderá, ainda, celebrar os 50 anos da Constituição da República Portuguesa e os 50 anos das primeiras Eleições Autárquicas, havendo, pois, disponibilidade e coragem política para tal. A nível nacional e a nível local.

Falta saber, e falta conhecimento sobre a nossa própria história. Nos planos curriculares e nas próprias formas como exercemos o poder local, muitas vezes direcionado para nós mesmos. Os públicos das palestras e das sessões solenes demonstram-nos isso mesmo – as caras são as comuns das vidas políticas; os jovens contam-se com os dedos de uma mão (e sobram), também eles já integrados nessas vidas. Onde poderíamos criar sinergias e cooperação entre poder, escolas e população, reside um vazio que, cada vez mais, tem de nos agitar.

É certo que não podemos lembrar o que a nossa memória não nos dá; mas há um caminho ainda possível a fazer. Façamos, então, o que podemos para que a nossa história não se apague e para que, um dia, não sejamos nós também apagados pelo conforto em que escolhemos viver.