Assinar


Consultório jurídico

Insolvência Pessoal – o direito ao perdão de dívidas?

Rui Borges
Advogado
Cofundador da CBA Legal Advisors
cba-legal.pt  

Há, naturalmente, requisitos que terão de se verificar e condições que terão de ser cumpridas, para que este benefício seja concedido, da mesma forma que existem exceções às dívidas passíveis de serem “perdoadas”.

Vermos um Governo anunciar medidas para apoio às famílias é, via de regra, o pronúncio ou a confirmação de uma crise. E, por ser assim, torna-se inevitável que muitos se interroguem, então, sobre quais as suas reais possibilidades (e soluções jurídicas ao dispor) caso aquelas medidas não sejam suficientes para ultrapassar as dificuldades económicas, pública e notoriamente, sentidas por muitos portugueses.

Em abono da verdade, existem hoje alguns instrumentos que poderão ajudar a mitigar o problema, como é o caso do “PARI” (Plano de Ação para o Risco de Incumprimento) e do “PERSI” (Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento) se falarmos de incumprimento junto da Banca. Ou até mesmo do PEAP (Processo Especial para Acordo de Pagamento), pensado para pessoas singulares que estejam em situação económica difícil ou numa situação de insolvência meramente iminente, pressupondo a negociação com os credores para (tentar uma) restruturação do passivo, por meio de um acordo de pagamento, que permita evitar a insolvência.

No entanto, não é incomum que estas soluções e revelem meros “paliativos”, apresentando-se a situação de insolvência como uma inevitabilidade ou, até mesmo, como uma realidade já consumada. Nesses casos advinha-se um Processo Judicial de Insolvência (Pessoal), despoletado ora próprio devedor, ora por algum credor deste.

Em traços muito genéricos e práticos, poder-se-á dizer que no âmbito destes processos, das duas uma: ou é apresentado (com sucesso) um plano de pagamentos, naturalmente visando liquidar as dívidas existentes e manter o património do devedor na esfera deste; ou, tal não sucedendo, mais não resta do que usar todo os bens do devedor, que ficará sem eles, para (tentar) ressarcir os credores.

Mas, a verdade é que é neste último cenário que a Lei prevê uma possível relevante “mercê” a ser concedida ao Devedor: quando for pedida e dentro de determinados pressupostos, poderá ser-lhe concedida a Exoneração do Passivo Restante, caso o respetivo património não assegure o pagamento da totalidade das dívidas. Cenário que, diga-se, é o mais comum.

Ora, se o nome é duro no ouvido, aquilo que este benefício representa é, seguramente, muito mais apelativo: quando concedida, a exoneração do passivo extingue a generalidade das dívidas que não forem saldadas no processo de insolvência, libertando o devedor das mesmas e permitindo-lhe recomeçar a sua vida. Em termos leigos e para simplificar, é algo similar a um perdão das dívidas.

Há, naturalmente, requisitos que terão de se verificar e condições que terão de ser cumpridas, para que este benefício seja concedido, da mesma forma que existem exceções às dívidas passíveis de serem “perdoadas”.

Não causará, acreditamos, estranheza o facto da generalidade das dívidas ao Estado (Segurança Social, Autoridade Tributária, etc.) não se contarem entre as que poderão desaparecer. Por outro lado, também não será surpreendente que exista um período, atualmente de três anos, em que o devedor poderá ter de entregar parte dos seus rendimentos para o Processo de Insolvência. Logicamente, convenhamos, que a Lei não é indiferente à necessidade de sobrevivência do devedor pelo que parte dos rendimentos daquele manter-se-ão na respetiva posse para fazer face ao seu dia-a-dia. E é por isso que o valor concreto dependerá da circunstância de cada um, assumindo relevo factores como a dimensão do agregado familiar e, quiçá, a existência de filhos menores a cargo do devedor.

Tudo somado, um cenário de Insolvência Pessoal, com Exoneração do Passivo Restante, poderá ser, muitas das vezes, a única real e verdadeira saída para situações económica aflitivas e asfixiantes, que consabidamente surgem e se agravam durante os tempos de crise, em especial os provocados por contextos dificilmente antecipáveis pelo cidadão comum, como são os casos de uma Pandemia, de uma Guerra na Europa e da vertiginosa subida das Taxas de Juro e da Inflação que se seguiram a estes eventos.

Ressalva legal: O presente artigo é meramente informativo e o seu conteúdo não pode ser considerado como prestação de serviços ou aconselhamento jurídicos, de qualquer natureza. Este artigo é, por natureza, genérico, abstrato e não é diretamente aplicável a qualquer caso concreto, pelo que não dispensa a consulta de um profissional devidamente habilitado, não devendo o Leitor atuar ou deixar de atuar por referência ao seu teor.