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Manuel Armando

Padre

Agora, acredito…

Conseguir ter Fé subentende uma caminhada árdua que leva tempo, exige estudo e oração, tenacidade, coragem, persistência, paciência, humildade e muitas outras atitudes que devemos adoptar ou procurar sem limites marcados no tempo. Pessoalmente, neste propósito, não aceito, sem mais, o dito frequente «é preciso ver para crer.»

Também é certo que algo experimentado de modo palpável pode situar-nos num gozo fictício de certezas sobre tantas coisas procuradas até durante alguns anos. Por vezes, parece-nos ter alcançado o conhecimento pleno de alguma realidade no campo da Ciência desenvolvida por mentes privilegiadas, ou em artes, política, literatura, desporto e por aí fora. Todavia, bem depressa, deparamos com a nossa fragilidade ou ignorância.

Não seja isso, aliás, a fazer-nos enfraquecer em personalidade ou vontade e consciência do real. Há que continuar a trabalhar, meditar e aproveitar quanto as pessoas mais abalizadas nos podem ensinar. Nunca sabemos tanto que não possamos aprender mais, porque lá se diz, popularmente, que o saber não ocupa lugar.
Quem, ciosamente, procura a Fé, encontrará alguma luz que irá mitigar a dor das dúvidas e barreiras humanas.

Frequentemente muitas pessoas de variadíssimos quilates das esferas sociais se têm acercado de mim para abordarem a suposta presença de “almas penadas” em que creem piamente.
Nos dias que correm, dou de caras é com as bastantes “almas depenadas”, pois o clima social e económico desta nossa época depena, com a mais rude desfaçatez, famílias e famílias ou indivíduos particulares que vagueiam para todos os lados na esperança de encontrar condições de vida digna. Estas tais “almas depenadas” são um autêntico exército que luta contra os depenadores que abundam em número a dar-lhes com um pau.

Apoiado no espírito cristão decente, não creio que os nossos irmãos que partem, rumo à eternidade, voltem cá com advertências, sejam elas quais forem. Até seria útil acontecer e, talvez, com tal base, muito do mundo mudaria para melhor, por força do esclarecimento ou medo.
Já agora, e na coerência com o título desta minha crónica, devo confessar que me tornei crente em “almas penadas” e passo a explicar como e porquê.

Numa destas noites de invernia, tentava eu descansar tranquilo, o que é apanágio das minhas noites, graças ao Senhor, mas o barulho era frequente e forte, rangiam as portas e janelas com o vento impetuoso. Tudo normal, pensava eu. Acordei mais cedo do que o habitual, por dever de missão. Quando comecei a tratar da minha higiene, fui abalroado com a impressão de alguém se agarrar aos meus ombros. Lufada de vento, considerei, mas alguma coisa esquisita me levou a esquadrinhar os cantos, na mira de explicar a mim mesmo que não devia explorar o medo. Quando descia as escadas interiores para ir celebrar Missa – era Domingo – descobri a presença de uma “alma penada”, pois, pela noite adentro, entrou pela chaminé da cozinha uma linda coruja. Naquelas horas nocturnas passeou, esvoaçando nos vários compartimentos. Fez desabar tudo quanto estava solto por cima de móveis e paredes, certamente na preocupação de achar uma possível saída para antes do romper da aurora. Ouvi o barulho das suas andanças, mas como era noite de muito vento e chuva, descurei quaisquer outras pesquisas ao ambiente criado.

Ainda consegui encurralá-la no quarto de banho para onde fugiu e, quando regressei, uma hora depois, abeirei-me com delicadeza, fiz-lhe uma fotografia de memória, ela sorriu virada a mim, abri-lhe a janela e desejei-lhe bom Domingo e boa caça.
Agora e por isso, fico a acreditar que “almas penadas” podem visitar-nos em qualquer dia ou noite.
Por estas e outras, há quem permaneça em pânico, com necessidade de recorrer, sem êxito, à psiquiatria ou a consultas espirituais.

Convenhamos, antes, que em semelhantes ocasiões, deveremos procurar a razão ou causa do sucedido. Haja prevenção.