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Manuel Armando

Padre

Frustração dos pais, desconforto nos filhos

Lembro, com alguma frequência e a propósito de determinados casos concretos, a pequena história de um pai em conversa com outro pai sobre que futuro haveriam de proporcionar aos filhos que estavam em fase de crescimento para a vida adulta.

Um foi dizendo como gostaria que o seu fosse, no futuro, uma figura dotada em Medicina, Letras, Direito, Economia, Exército ou outra coisa qualquer. Nalgum destes caminhos era bom que singrasse dentro da sociedade, com dinheiro e fama e aparecesse como grande senhor nas coisas valiosas e muito saber.

O outro homem, pesando a sua autoridade paterna que deveria estar na orientação de vidas e caminhos e achando até que seria obedecido em todas as circunstâncias e, convencido não ser possível algum desvio por desobediência do seu descendente, lá afirmou com certo ar pacóvio e autoritário: «pois o meu filho vai ser Bombeiro Voluntário, quer ele queira ou não queira».

Ora, nem mais!

Mesmo apesar de ter um cunho anedótico, esta historieta não deixa de trazer consigo a visão de filosofia simples da vida que, nos nossos dias, faz aflorar uma verdade que em psicologia não se conseguirá explicar.

Todavia, nós mesmos poderemos tentar entendê-la se olharmos atentamente para o paradigma de pensamento que, em alguns campos de vida, incide no prisma do metal que soa no bolso de muita gente conhecida, num mundo alienado do essencial mas sonhando-se nos braços das grandes somas económicas, querendo equiparar os filhos a algumas figuras proeminentes nos diversos sectores operacionais de elite que, por sua vez, tantos deles trabalharam apenas para badalar o nome e se deixaram, depois, cair no lodaçal de uma sociedade que rechaça os inúteis e os pobres em geral.

Mau é, portanto, quando há pais que, aparentando senso, prescindem de um acompanhamento educativo e sempre zelosamente cuidado dos seus filhos, não lhes oferecendo oportunidades de crescerem no corpo e nas outras dimensões como o são a moralidade, o trabalho, a honestidade, os conhecimentos provindos do estudo, a presença em família, a verdade, a espiritualidade apoiada numa religião – seja qual for – e os obrigam a enveredar por vias para as quais a sua apetência não é a melhor.

Uma vez enredados naquilo que não faz a base do seu “modus vivendi”, jamais encontram lugar para as suas capacidades de produtividade e estas mostrar-se-ão supostamente reduzidas ou mesmo nulas.

Resultado: – arrastam-se na vida, acarretando na sua cerviz um desconsolo e inadequação que os transformam em indivíduos sorumbáticos, isolados e desnorteados, porque envergonhados pelo insucesso pessoal inevitável.

Quando alguém, familiarizado com o assunto e responsável, descobre esta situação, pode ser já tarde e a oportunidade desaproveitada não ter retorno possível.

Nem todos chegam a fazer-se desportistas, ou melhor, futebolistas de craveira e nomeada. O fito do dinheiro não deverá ser a meta final de algum jovem em corrida, porque há sempre alguém que possui melhores qualidades e forças para chegar em primeiro lugar, e essa é a única razão exigida na consecução do troféu.

Orientar, sim, essa é a função de qualquer pai prudente. Nunca lhe compete impor seja o que for de modo a desestabilizar a mente de qualquer rapaz ou menina.

“Mens sana in corpore sano” é o conselho, satírico e elucidativo, do poeta retórico romano Juvenal.

Ambas as coisas são essenciais, mas a mente equilibrada conduzirá a pessoa a procurar o seu verdadeiro lugar na vida onde se pode achar plenamente realizado e feliz.

Certos jovens de hoje são desviados da sua natural vocação pelos próprios pais que vêem – erradamente – nos filhos a reabilitação das suas antigas tentativas falhadas na arte ou no desporto. Imaginam, assim, vingar-se da vida, impondo nos ombros deles os fardos dos quais nunca puderam ou souberam desenvencilhar-se.

Nessa peculiar frustração de muitos pais reside o desconforto e o desespero de muitos filhos.

Oxalá, isso comece, de vez, a ser acautelado.