Assinar

Manuel Armando

Padre

Instinto ou inteligência?

Fosse eu biólogo e tivesse veia de cientista, analista ou investigador, haveria de fazer pesquisas sobre a existência, hábitos e práticas, reacções, comportamentos e muitas outras coisas mais e deveria estudar, descobrir, expor, discutir e defender bastante sobre o que são os animais e também condenar certas actuações do Homem que, sendo racional como se diz, age em numerosíssimas ocasiões e circunstâncias sem pensar com um cérebro positivo e a voltar-se para a inutilidade e destruição pessoal.

Gosto de observar os muitos trejeitos de certos animais, cujo nome de muitos até desconheço. E não é necessário gastar tempo a remexer compêndios no intuito de conhecer a origem e metamorfoses de determinadas espécies, mas, estudando algo sobre a sua estrutura e compleição gigantesca ou microbiana, perdemo-nos numa admiração por tal Natureza tão fascinante.

A nossa observação diária, até desinteressada, faz-nos percorrer longas etapas da História e encontrar materiais e ensinamentos acerca dos inúmeros espécimes de animais exóticos ou mais comuns e vulgares.

Encantam-nos os seus procedimentos naturais e, por vezes, os de uma rudeza inaudita. Vendo-os, ao vivo, muitos deles nos farão arrepiar os cabelos pela demonstração de capacidades fantásticas tão diversificadas. Seria formidável analisar até ao último pormenor tudo aquilo que possuem e manifestam.

Quanta força física têm algumas classes de bichos, aliada à astúcia, destreza, sentido de defesa, organização de clã, facilidade de orientação, percepção de acontecimentos a distância, apego a tratadores e donos, fidelidade à família, “uso de normas sociais”, e por aí adiante!

É bem evidente que falo muito sumariamente dos animais de médio ou grande porte, porque, se referirmos os seres de estrutura minúscula, somos surpreendidos pelo alcance “inteligente” de se organizarem em ordem à obtenção dos melhores e visíveis resultados.

Atentemos, a título de exemplo, na obra laboriosa das abelhas das quais saboreamos a doçura produzida pelo “suor” do seu empenhamento bem estruturado e harmonioso que abrange centenas de elementos da família.

E como admirar o afã constante das formigas que unem todos os esforços nas suas empresas mais árduas, dentro do seu habitat familiar?!

Fixemo-nos, porém, nas lições a tirar de aves conhecidas que respeitam usos e costumes ancestrais sem nada mudar naquilo que lhe é próprio por sua natureza.

Para tal, ponhamos os nossos olhos, curiosamente e como protótipo, no estilo de viver das andorinhas. Quão saudável é notar o modo como vivem em arribação e estadias temporárias nalguns lados. Vêm de terras longínquas, percorrem milhares de quilómetros para aportarem nas mesmas “casas” reabilitadas pelos progenitores mais próximos ou remotos no tempo. Tudo aproveitam e não aniquilam a arquitectura inicial e sempre igual.

Cumprem a sua missão de reprodução, nada regateiam e retrocedem às primeiras paragens com a promessa de voltarem nos anos seguintes.

Outro modelo, quiçá semelhante, podemos encontrá-lo nas cegonhas – quase cópia das andorinhas. Quando chegam, reorganizam o seu “modus vivendi”, limpam os campos de elementos adversos e, depois da reprodução, regressam aos seus meios de origem.

Umas e outras não se metem em guerras, não fazem mal a ninguém e nada destroem.

Dizem que os animais se movimentam em todo o tempo pelo que chamamos o instinto. Seja! Todavia, concordemos que, sendo imitadas, contribuiriam para a sanidade humana universal.

Detenhamo-nos então no mundo dos homens. Residentes no seu sítio, ainda que com a liberdade de migração, vão, contudo, e de muitos modos, destruindo aquela que é a obra harmoniosa da Criação.

E, se não, vejamos: – o Homem destrói a harmonia e a paz – por isso, se levantam vozes em todo o mundo com apelos veementes em favor do respeito e bom uso da liberdade total – conspurca e arrasa a Natureza com aberrantes gestos e abusos, arruína habitações, mesmo as mais sofisticadas, vicia os costumes e a moralidade, procura matar a essência da família, desrespeita a própria vida, evitando ardilosamente o seu aparecimento ou promovendo-lhe a antecipação de um final que deveria ser natural ou abrindo pressupostos existenciais incompreensíveis e incompatíveis com a dignidade da vida comum.

Felizes sejam, pois, quantos pugnam, no bom senso, pela grandeza da mentalidade higiénica e inteligente dos humanos.

Oxalá não cheguemos nunca a inverter os termos e concordar que o instinto de muitos homens se situa abaixo da inteligência de alguma categoria de animais.