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Manuel Armando

Padre

Já convivi com santos

Só um pequeno apontamento para a todos nos ajudar a pensar que vivemos imersos numa sociedade construída sobre os mais diversificados tipos de pessoas, antes de chegarmos propriamente aos grupos que, por sua vez, os integram, aproveitando-os com as suas qualidades e os seus defeitos peculiares.

A convivência, por trabalho ou divertimento, oferece ocasiões soberanas para aquilatarmos de como o universo humano é formado, encomendando-nos a responsabilidade de descobrir nele muitas razões para se buscar a harmonia, a paz e a sanidade mental.

Não é fácil, mas será na multiplicidade de tendências próprias que havemos de procurar pautar o nosso caminho pessoal.

Há um amálgama de situações psicossomáticas e nelas mergulhamos o nosso saber ou as nossas incapacidades neste trajecto que há-de ser trabalhado, de modo a usufruirmos as vicissitudes positivas da vida no seu todo.

Inviável é calarmos determinados pontos fracos ao fazer sobressair tudo quanto existe de enriquecedor no viver de todos.

Dever-se-ão limar arestas ou arrasar vales, equilibrando sem sobressaltos a vida em cada dia com o que a nós se apresenta tão surpreendente como até esperado.

Ao longo dos anos e na prática de encarar tudo quanto faz parte do conhecimento ou do imprevisto já me detive com pessoas más, inconscientes, indiferentes, esquecidas, irrequietas, desonestas, insolentes, mal-educadas, quezilentas, vingativas, oportunistas, chatas, carraças ou lapas, interesseiras, bárbaras e sem sentimentos, desconfiadas, mentecaptas, desesperadas e desesperantes, ferozes, malvadas, mentirosas, rancorosas, invejosas, pessimistas, narcisistas, irritáveis e irritantes, belicosas e biliosas, ariscas, teimosas e inflexíveis, mal-intencionadas, coscuvilheiras, alcoviteiras, raivosas, despersonalizadas, preconceituosas, fugidias, descontroladas, sensacionalistas, fantasistas, apáticas, mandrionas, fechadas, caras-de-pau, individualistas, presunçosas, hipócritas, arrogantes, perniciosas, egoístas, individualistas, farsantes, obscuras, complexadas de superioridade, psicóticas e tudo o mais que o leitor pode e sabe acrescentar.

Todavia e em contrapartida, devo aduzir a outra face da vida, ensaiada com regozijo e gratidão.

É que já passaram, em frente a mim, almas verdadeiramente eleitas para a pureza da bondade, justiça, felicidade experimentada e doada na plena generosidade e consciência de quem procura reconstruir na humanidade um novo paraíso.

Também se depararam, nas minhas passadas vacilantes e temerosas, marés privilegiadas com criaturas, abençoadas porque grandiosas de espírito e sensatez, magnânimas, caridosas, impressionantes de brandura, compreensivas, auxiliares, interessadas e colaboradoras, silenciosas, comprometidas, pobres mas respeitadoras, contentes com o bem-estar dos outros, atentas, acolhedoras, prestáveis e abnegadas, conscientes dos seus limites, mas tenazes, abertas, sinceras, educadas e reconhecidas, verdadeiras heroínas na honestidade e simplicidade, firmes na sua fé e amor à verdade, esquecendo ou levando a esquecer as agruras mais sérias e pesadas da existência humana.

Já “tropecei” com a realidade de santos.

Continuo sempre impressionado quando relembro as figuras de duas ou três pessoas de quem me abeirei e cujo processo canónico está em curso na direcção dos altares. E não quero omitir as muitas outras personagens simples do povo que, durante todo o tempo de trabalho, me ensinaram a confiar com o olhar jubiloso do dia-a-dia.

Tudo isto como examinação do nosso mundo onde grassa o mal, mas no qual reside também a forte convicção de que a maldade e o pecado jamais vencerão a Graça e o poder do Criador.

«Se permanecerdes fiéis à minha mensagem, sereis verdadeiramente meus discípulos; conhecereis a verdade e a verdade vos tornará livres» (Jo.8/32).

«Eu disse estas coisas para que em Mim tenhais a paz. No mundo sofrereis tribulações, contudo, tende confiança! Eu já venci o mundo» (Jo.16/33).

Assim, pois, se vai renovando e estimulando a nossa permanente esperança.