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Carlos Vinhal Silva

Criminólogo

Já podemos falar a sério sobre o terrorismo?

Após uma longa semana de alvoroço por conta de uma suposta tentativa de praticar um ato de terrorismo, retomámos novamente o silêncio e a monotonia tão típicos dos dias comuns. De facto, não tentamos negar a gravidade dos atos cometidos na sua forma tentada, mas consideramos que foi imprudente ou, no mínimo, precipitado a sua categorização como terrorismo, esquecendo ações que têm sido recorrentes nas últimas semanas e cujo potencial é muito mais daninho que ações isoladas de um indivíduo só. Novamente, recordamos que não tentamos desculpabilizar qualquer ato que causa ou pretende causar um dano a qualquer ser humano, apenas alertar que há outros casos que se inserem muito melhor no quadro do terrorismo ou do ciberterrorismo, mas que, por qualquer motivo, têm passado pelos pingos da chuva da apreensão geral, ainda que noticiados abertamente nos meios de comunicação.

Falamos dos atentados contra as páginas web da Assembleia da República que evidenciam uma oposição à soberania nacional e a todo o Estado português (cidadãos incluídos); falamos do caso dos ataques à imprensa, perpetuados por grupos de piratas informáticos com profundo desrespeito pela liberdade, ou dos ataques executados contra redes de comunicação móvel, demonstradores da intolerância perante a vida humana e das relações estabelecidas. Se é verdade que muitos destes ataques não tiveram uma influência direta particularmente grave na vida das pessoas, não podemos negar que o país, aos olhos da globalidade em que estamos inseridos, viu a sua imagem enfraquecida. Contudo, em consequência particularmente do atentado contra as redes móveis de comunicação, comprovadamente que houve falhas na comunicação, nomeadamente com hospitais: quantas pessoas terão tido atrasos no atendimento que, se não foram já nefastos, poderão revelar essa nocividade a médio-longo prazo; e podemos ainda interrogar: quantas pessoas terão sido vítimas de agressão, no seio familiar ou não, por não conseguir contactar as autoridades, ou quantas pessoas não se terão conseguido despedir pela última vez dos seus entes queridos?

Portanto, vemos que os atos, ainda que não sejam inauditos, não têm sido escrutinados da melhor forma, não têm sido enquadrados no âmbito do terrorismo, apenas porque não é executado com armas, considerados idóneos, ou, ainda, não mataram ninguém. Mas quando atacarem as reservas de água neste período de seca que temos vivido, ou virmos afetadas as redes de energia que alimentam as nossas casas ou os nossos hospitais, e verificarmos as primeiras vítimas mortais, talvez possamos abrir os olhos e ter uma discussão a sério acerca do terrorismo, com verdadeiros especialistas, e não com tudólogos que, acreditando saber tudo, revelam a sua ignorância ao não dizer nada que se aproveite.