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Manuel Armando

Padre

Meu país de “ilusionistas”

Há mágicos que conquistaram nomeada nos seus países de origem com o bom desempenho na arte de iludir, divertindo populações, no seio dos seus compatriotas, como também atingiram os louros da fama, através de digressões pelo mundo além, donde partiram, depois, escritos e notícias que passaram mares, levando o nome das suas terras a serem badalados com alguma e justa admiração.

A magia é sempre motivo de assombro pelo “mistério” com que se apresenta aos olhos comuns humanos que, por tudo, tentam encontrar a via condutora de tal meada mesmo que, para isso, tenham de passar longas horas a fio, ligados ao desenrolar da sequência das habilidades.

E quem mais vibra com este género de divertimento tão misterioso e entusiasmante são as crianças ou os mais simples que não poem maldade em coisa nenhuma. Os outros, os maiores em estatura e idade ou classe social, é que se enfurecem diante do enigma com que se deparam. Os pequenos, esses, na simplicidade e verdade, logo perguntam como e porquê se faz “isto e aquilo”, correndo na ânsia de tocar com as suas próprias mãos os aparatos e descortinarem onde se possa reservar o segredo que tanto faz encantar.

Muitas vezes, mesmo a máxima atenção não capisca nada de nada.

E todos nós quando, perante um problema incomum, gastamos as nossas energias intelectuais e sensitivas, pensando-nos ludibriados e, de certo modo, coniventes em determinados factos, por insuficiente reacção ou atenção, parece acomodarmos a nossa pessoa a quanto se passa ao nosso lado e, dessa forma, corremos o risco de grandes prejuízos.

Pode, porém, suceder que os trejeitos mágicos, sendo acção persistente e repetitiva, passem ao nível de corriqueiros, sem qualquer vantagem nem gosto.

O artista, contudo, não desanima e arranja sempre outros pozinhos que alimentem racionalmente o encanto, evitando que se perca a sequência do trabalho e se entre numa acomodação doentia, porque tornada força perante a frustração ou desinteresse, o que, muitas vezes, poderá significar sinal de fracasso ou incapacidade.

A magia é uma realidade “mentida”. O mágico – prefiro mais o termo ilusionista – procura escamotear a verdade. E, como o faz? Tenta desviar a atenção de todos os seus ouvintes ou espectadores para o lado oposto àquele onde se desenrola a acção que vai causar impressão eufórica numa assembleia a quem é ocultada a verdade noutro sítio, previamente preparado com o intuito de não escancarar um interesse e importância social pessoal que se anseia alcançar.

Na sociedade em que vivemos prolifera um sem número de ilusionistas, diplomados na escola do desaforo e desvergonha quanto aos mais diversos ramos e que intentam distrair o olhar de quem acompanha o desenrolar dos acontecimentos que passam todos os dias no palco da vida, onde alguns mandam ou (se)governam, dando nota de serem autênticos artistas do inverosímil. Ora, vejamos alguns pormenores: – fazem multiplicar os preços de tudo e a toda a hora, usurpam poderes alheios, adquirem por modos obscuros benefícios pecuniários chorudos, mentem sobre os mesmos, escondem-se atrás das suas cadeiras de magnates, são acusados em processos que parecem não entrar nas instâncias judiciais, a tempo e horas, porque vão prolongando a sua presença em palco até que o tempo ceda o favor de andar mais depressa e prescrevam os prazos válidos, ou, sem deixar de mencionar, ainda as varinhas mágicas que, caindo ao chão, partem e sobre as quais, em consequência, é exigida indemnização avultada (útil à compra de melhores varinhas) ou de reparar nos sacos azuis de dupla bolsa, lindos de morrer, mas postos no fundo dos cofres, longe dos curiosos, tidos como mal intencionados, e mais por aí fora.

Ah, já me ia esquecendo. Os mesmos grandes artistas convocam ou mandam promover conferências de imprensa para lançarem suspeitas e acusarem inocentes, desviando, assim, as atenções de cima daqueles que, sendo considerados culpados, não entram na pildra porquanto continuam em cena a demonstrar como se engana quem quer que seja. Cospem para o lado, alvejando o pobre Zé que apenas esboça um simples gesto de nojo.

Realmente, quer admitamos ou não, vamos habitando um país de, sobejamente conhecidos, mas, por muitos, aplaudidos “ilusionistas”.

Texto escrito ao abrigo do anterior acordo ortográfico, por vontade expressa do autor