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Manuel Armando

Padre

Por favor, Senhor, ressuscita minha Mãe!

Posso não ser progressista, mas retrógrado é que não sou, com toda a certeza. Todavia, gosto de recordar factos e pessoas de antigamente, pois nisso há sempre alguma coisa a confrontar com práticas demarcadas dos nossos dias.

Quando comparamos acontecimentos e indivíduos passados, frente a atitudes dos nossos actuais companheiros de viagem, extasiamo-nos perante as metamorfoses sofridas pelas pessoas ao longo dos tempos e, convenhamos, imaginaríamos, decerto, uma determinada e segura evolução moral global.

Mas parece, em variadas ocasiões e circunstâncias, termos, quase obrigatoriamente, de lastimar que haja, com bastante pena nossa, construções a derruir por não se terem acautelado os alicerces projectados e postos à consideração da liberdade dos indivíduos e dos grupos ou, se quisermos ser mais abrangentes, dos cidadãos e dos Governos constituídos.

Tantas têm sido, nas aldeias, vilas e cidades, as edificações familiares de uma arquitectura simples, mas de uma beleza artística inédita a que, só agora, sucede darmos apreço, deplorando o seu desmoronamento feito pela mão dos homens e autarquias a título de melhoramentos e actualizações. Aquelas habitações quentinhas de alma e arte vão dando lugar, nestas épocas, a mamarrachos engenhados no cimento armado e frio. De dentro das suas portas e janelas, despejam-se avalanches de indiferença humana gelada.

Do que pertencera ao antigo, nada deveria desaparecer simplesmente, mas sim renovar-se, alindar-se mais, dando-lhe um uso futuro condizente com as suas propriedades de beleza e simplicidade genuínas.

Os nossos avoengos sabiam desempenhar os seus papéis na feitura da sociedade, com empenho e alguma frontalidade. Não alardeavam os seus saberes populares tradicionais nem reclamavam direitos adquiridos pela sua dedicação ao trabalho ou sentido de ajuda, entre povo.

Confundem-me os recentes movimentos reivindicativos dos sectores mais diversos da laboração humana, embora tente acatá-los.

Mas no que concerne à saúde nem ouso trazer para a ribalta pública quanto penso e lamento sobre tão ingente problema.

Aqui está uma secção que olho com ânsia e perplexidade, não querendo nem podendo imaginar, num futuro muito próximo, o grotesco caos implantado com elevada força no seu seio.

Aduzo concretamente a profunda e consciente apreensão, pela intervenção humana em diversos assuntos candentes e seu desenrolar tão desencontrado nas comunidades ditas capazes.

Era legítimo supor-se, por exemplo, haver a preocupação de respeitar a mulher na sua abnegação em abraçar o papel sublime e divino de ser mãe como, concomitantemente, a defesa da vida de qualquer nascituro.

E que vemos? – Na praça pública, o aconselhamento, mesmo que subtilmente feito, ao desaparecimento de quem nem sequer ainda viu a luz do dia, ou o recrudescimento da dor e angústia daquelas que deveriam experimentar, com esperança e plena alegria, a nobreza de serem mães.

É crível não chegarmos a perceber o porquê do fechamento de algumas Maternidades e serviços afins e as reservas sistemáticas em outros lados.

Aqui, portanto, abro parênteses e peço: – «Por favor, Senhor, ressuscita minha mãe!».

Sei que nasci para os braços de uma avó, como todas as minhas irmãs, e também lembro que minha mãe assistiu o parto dos meus sobrinhos “aparando-os” para o seu regaço com vivo regozijo e preocupação pelo trabalho bem feito. E rematava sempre que “aparar” netos é parir com amor duas vezes.

Uma bacia ou escudela grande com água quentinha, a toalha pobre, mas adequada e os sabões à medida eram o início de um ser desejado e amado que viria a preencher os recantos da aldeia com as suas gentes que compartilhavam a mesma euforia num clima deveras familiar.

Admitindo, é claro, todo o desenvolvimento estrutural da sociedade e no campo da Medicina, sobremaneira, talvez minha mãe e outras quejandas mulheres, “vindo até cá”, pudessem ajudar, sem exigir retribuições nem louvores e a vida começasse a sorrir para os que abrem os seus olhitos numa contemplação da beleza e amor de Quem os põe no mundo e quer ver felizes dentro da sua eterna obra.