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Manuel Armando

Padre

Porquê alguns falam tanto?!

Uma das minhas virtudes – quero dizê-lo sem a mínima ponta de vaidade, porque elas até nem serão muitas – é não invejar quem possa ter os bolsos cheios de dinheiro, ocupar um lugar especial e cimeiro na sociedade, saber muito e destacar-se dos demais, como também usufruir de outras prerrogativas importantes, merecidas ou até forjadas a esmo.

Nada disso me move a um milímetro de cobiça. Pelo contrário.

Ser superior a tal é gozar uma vida livre e tranquila, longe do incómodo de ter de responder a interrogatórios contínuos para os meios sociais de comunicação ou ainda a diálogos exigidos por repórteres populares de ocasião.

Ainda assim, admiro a capacidade dos diferentes homens e mulheres que, em todos os tempos e lugares, demonstram capacidades e dons, completamente fora do comum.

Basta haver uma ocasião propícia, mesmo que fortuita, para serem evidenciados e aproveitados certos dotes pessoais de características sumamente singulares que nos deixam especados perante a afirmação de tanto saber.

Talvez a faculdade de algumas pessoas esteja na facilidade da invenção de conhecimentos gerais, exibidos sobre os mais variados temas da presença e actividade humanas, próximas ou longínquas no espaço e no tempo.

Há os que falam ou escrevem e avaliam os grandes momentos de uma história e lugar como se fossem eles as verdadeiras e únicas testemunhas presenciais, fazendo denotar posições extremas de uma determinação insofismável – assim o querem mostrar – perante todo e qualquer problema, por bem intrincado que se apresente.

Fica, porém, a minha cabeça a ruminar pensamentos de dúvidas acerca dalgumas convicções alheias.

Repito que não suporto quaisquer suspeitas sobre a capacidade intelectual e cultura sempre actualizada seja de quem for, nem as reticências fazem mossa neste meu modo de ser.

Acato, pois, e exalto quanto possa aprender-se com os pronunciamentos e lições de quantos se afirmam “entranhados” nas experiências quase palpáveis do quotidiano das gentes, em tudo o que concerne à doutrina social, económica, moral, religiosa, política e sei lá mais o quê, emitindo as constantes opiniões que acham teimosamente irrefutáveis, quando delas falam sem rebuço.

Causam-me positivo e vivo espanto as asserções de tantos oradores, cronistas, directores de alguma coisa, presidentes, deputados e economistas, ministros e respectivos correligionários e bastantes outros quejandos que botam faladura, a torto e a direito, a propósito e a despropósito, exprimindo as “certezas” das suas verdades sábias e conhecedoras das questões mais sofisticadas e as devidas soluções, exigidas e adequadas às diversas calamidades ou positividades da vida.

Não ouso refutar a amostragem de ciência e sapiência de quem quer que seja e, mesmo, aplaudo a facilidade com que abordam a diversidade dos meandros de qualquer matéria humana, local ou global, eu que, para organizar ideias de uma simples homilia de escassos minutos na Missa, ou mesmo a escrever umas magras linhas de crónica, me vejo em palpos de aranha, embora pense e queira transmitir alguma coisa capaz e de jeito.

Quem escreverá – pergunto – discursos diversificados, tão seguidos e com pretextos tão desiguais, para grandes senhores que parlengam quase ininterruptamente, em quaisquer lugares, circunstâncias e tempos?

Se tais prelecções são elaboradas por copistas, então que convicção podem transportar em si?

Não omitindo o mérito de quem semeia em boa terra os seus dons e os fazem frutificar, continuo a pasmar diante de inteligências tão prolixas, luminosas e iluminadas que tenazmente prosseguem o caminho árduo de transmitir algo a uma humanidade que, por seu turno, supõe existirem espíritos que eduquem através das letras e palavras, mas que estas sejam traduzíveis em obras seguras, porquanto alicerçadas no uso de bom senso e verdade.